O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP) concedeu nesta segunda-feira (12) um habeas-corpus favorável aos líderes do movimento social denominado Frente Nacional de Luta Campo e Cidade (FNL) José Rainha Júnior, Luciano de Lima e Cláudio Ribeiro Passos, que estavam presos preventivamente desde o último mês de março, e mandou soltar os três provisoriamente.
Em sessão permanente e virtual, a maioria dos integrantes da 13ª Câmara de Direito Criminal do TJ-SP decidiu conceder a ordem de habeas-corpus para liberar provisoriamente os três presos, mediante a aplicação das medidas cautelares pessoais previstas no artigo 319 do Código do Processo Penal (CPP) consistentes em:
comparecimento mensal em juízo,
proibição de contato com as vítimas descritas na denúncia dos autos de origem e
recolhimento noturno domiciliar.
Na mesma decisão, o TJ-SP mandou expedir com urgência os alvarás de soltura dos três presos.
Pela denúncia apresentada pelo Ministério Público, os três foram acusados de cometer, em conjunto, os crimes de extorsão e associação criminosa contra fazendeiros da região do Pontal do Paranapanema, no extremo oeste do Estado de São Paulo.
Os primeiros a serem presos foram José Rainha Júnior e Luciano de Lima, no último dia 4 de março. De acordo com as informações repassadas pela Polícia Civil ao g1, José Rainha Júnior foi detido em um lote onde reside, no Assentamento Che Guevara, em Mirante do Paranapanema (SP), enquanto a prisão de Luciano de Lima ocorreu na Rodovia José Corrêa de Araújo, na divisa entre os estados de São Paulo e do Paraná, entre os municípios de Sandovalina (SP) e Jardim Olinda (PR). Já Cláudio Ribeiro Passos foi preso em Assis (SP), no dia 9 de março.
"A despeito da gravidade dos fatos investigados, tem-se que os autos apontam diversidade de condutas, que se imiscuem, inclusive, entre aquelas típicas da reinvindicação da reforma agrária, ainda que, de todo o modo, isto não exclua eventual ação ilegal de pessoas que desbordem das movimentações políticas. Nem a ação dos sem-terra pode ser a priori considerada ilícita (considerando o engajamento em lutas sociais legítimas) nem pode servir, por evidência, a acoimar eventuais excessos individuais", pontua o desembargador Marcelo Semer, relator designado do acórdão do HC.
"A impetração postula a revogação da prisão preventiva por uma incorreta avaliação da contemporaneidade, considerando que anterior pedido de prisão temporária por fatos acoimados de ilícitos havia sido anteriormente negado, e a possibilidade de 'novas invasões de terra' não seriam propriamente justificativas para a decretação das prisões preventivas - seja porque não se relacionavam diretamente com os fatos anteriores, seja porque não se relacionavam diretamente nem mesmo com os pacientes", prossegue.
Ele sustenta que a liberdade impera como regra no sistema processual penal e que a prisão preventiva deve ser decretada apenas excepcionalmente, cumpridos os estritos requisitos dos artigos 312 e 313 do Código de Processo Penal, e, ainda assim, apenas se as medidas cautelares alternativas à prisão se revelarem inadequadas ou insuficientes.
"É sabido que a gravidade do delito e a pena abstratamente cominada, isoladamente, não são indicativos que justificam a prisão cautelar à luz do regramento constitucional e processual penal. Afigura-se possível, dessa feita, a concessão de liberdade provisória, mediante o estabelecimento de medidas cautelares diversas da prisão, conforme o art. 319, do CPP", argumenta.
Na decisão judicial, o desembargador pontua que os presos são primários e possuem possui bons antecedentes, prova de atividade lícita e endereço fixo, "de modo que a prisão cautelar, por ora, não se mostra necessária, diante da falta de elementos concretos que justifiquem sua necessidade atual".
"Desse modo, as condições pessoais do paciente e as circunstâncias do crime, no caso em tela, não justificam a manutenção de prisão preventiva, dado que não se verifica a existência de dados concretos que apontem para a imprescindibilidade da continuidade da segregação cautelar, de modo a ameaçar a garantia da ordem pública, da instrução criminal e da aplicação da lei penal", salienta.
"É preciso o máximo de cautela para que não se utilize a prisão preventiva como mecanismo de julgamento antecipado da acusação formulada, e ao mesmo tempo, que não se acoime como ilegais ações que podem ter avaliações diversas no campo político, como já se consolidou em reiteradas decisões dos tribunais superiores", pondera o desembargador.
"Considerando a mescla de ações indicadas no inquérito, bem ainda a aparente severidade da medida extrema, meu voto concede a ordem nos referidos Habeas Corpus, para substituir a prisão preventiva dos acusados por medidas cautelares, de recolhimento noturno domiciliar (e nas horas de folga de atividades laborais), comparecimento pessoal em juízo mensalmente, e afastamento cautelar em relação a eventuais vítimas, que parecem suficientes para impedir perturbações de prova e garantir a instrução, sem desbordar para uma desnecessária e desproporcional antecipação de julgamento de mérito", enfatiza Marcelo Semer.