'Foi o único jeito de a gente se defender', afirma policial militar que reagiu a ataque a tiros disparados por CAC durante blitz

12/05/2023 08h06 'Eu e meu parceiro não queríamos este resultado final, porém, para salvaguardar as nossas vidas, não teve outro desfecho', disse em entrevista exclusiva ao g1 o cabo Fábio Vieira do Nascimento.
Por G1, Iepê (SP)
'Foi o único jeito de a gente se defender', afirma policial militar que reagiu a ataque a tiros disparados por CAC durante blitz .

O cabo da Polícia Militar Fábio Vieira do Nascimento, de 45 anos, contou em entrevista exclusiva ao g1, nesta quarta-feira (10), como foram os momentos em que precisou reagir rapidamente para conter o ataque "inesperado" de um homem armado que teve o seu carro apreendido durante uma blitz de trânsito, em Iepê (SP), por falta de licenciamento veicular. O companheiro de Nascimento na fiscalização, ou seja, o soldado Fábio Hatschbach Capuano, de 35 anos, foi baleado pelo motorista e ainda está hospitalizado em tratamento médico. Após atirar contra os policiais militares, o mecânico Fernando Paiano Gerônimo, de 37 anos, que possuía registro legal de arma de fogo junto ao Exército como Colecionador, Atirador Desportivo e Caçador (CAC), também foi atingido por disparos feitos em legítima defesa pelo cabo e morreu.

"Posso falar que, no momento, foi tudo muito automático. Na hora em que eu escutei o disparo e ouvi meu parceiro gritando que tinha sido atingido, a primeira reação minha foi me abrigar, para depois conseguir repelir a injusta agressão. Após ter conseguido cessar a agressão, foi que eu consegui voltar até a viatura, pegar meu parceiro, colocá-lo no banco do passageiro e socorrê-lo até o hospital", relatou Nascimento ao g1.

O cabo ainda pontuou que, no momento da fiscalização do carro, o mecânico Fernando Paiano Gerônimo teria ficado “um pouco indignado por ter o veículo dele guinchado, porque já estava há alguns anos com o licenciamento atrasado”, mas enfatizou que o homem não havia mencionado nada sobre voltar até o local.

“Ele foi liberado e foi embora a pé para a casa dele. Ele não falou que ia voltar e nem fazer nada. Foi inesperado, a gente estava aguardando o guincho chegar para remover o veículo até o pátio", acrescentou.

O policial militar ainda explicou que foi foi a primeira experiência profissional dele envolvendo uma ação "desta forma".

"Poderíamos, tanto eu quanto o meu parceiro, não estar aqui para estar contando essa história. Fica marcado, porque é algo inesperado, a cidade é pequena. Aqui foi a primeira vez que aconteceu, da forma como aconteceu. Eu e meu parceiro não queríamos este resultado final, porém, para salvaguardar as nossas vidas, não teve outro desfecho. Foi o único jeito de a gente se defender", concluiu Nascimento ao g1.

Estado de saúde do soldado

O Hospital e Maternidade de Rancharia (SP) informou ao g1, nesta quarta-feira, que o soldado da Polícia Militar Fábio Hatschbach Capuano ainda está internado no local e não recebeu alta médica por conta de uma cirurgia, que foi realizada com sucesso, em seu dedo atingido por um dos tiros.

O militar está se recuperando, conforme o hospital, e seu estado de saúde é considerado estável.

Legítima defesa

Ao ser questionado se a legítima defesa por parte do cabo seria confirmada, em conversa com o g1, nesta quarta-feira (10), o delegado Carlos Henrique Fernandes Gasques, que responde pelas investigações sobre o caso, disse que “aparentemente sim”.

Gasques ainda citou que a Polícia Civil já requisitou as perícias e está fazendo as “análises das imagens de câmeras de monitoramento” que flagraram a movimentação no local da blitz de trânsito.

“O inquérito está em andamento, estamos aguardando retornar os laudos periciais e agendar as oitivas das demais pessoas que teriam presenciado os fatos", complementou Gasques.

O caso

O mecânico Fernando Paiano Gerônimo morreu na madrugada da última segunda-feira (8), após trocar tiros com policiais militares, em Iepê.

Segundo a Polícia Civil, a vítima teve o carro apreendido por falta de licenciamento, durante uma blitz de trânsito, e atirou contra os agentes, que revidaram. A câmera de segurança de um estabelecimento comercial flagrou o momento em que o homem aproxima-se a pé e atira contra os militares (veja o vídeo acima). O dono do veículo possuía registro legal da arma de fogo junto ao Exército como Colecionador, Atirador Desportivo e Caçador, condição também identificada pela sigla CAC.

O soldado da Polícia Militar Fábio Hatschbach Capuano, de 35 anos, foi atingido na cabeça e na mão pelo motorista.

Conforme o Boletim de Ocorrência, dois policiais abordaram um carro durante um bloqueio de trânsito na Rua São Paulo, na área urbana. Ao consultar no sistema, os agentes constataram que o licenciamento do veículo estava vencido desde o ano de 2019 e, portanto, apreenderam o carro.

Enquanto aguardavam a chegada de um guincho para recolher o automóvel, aproximadamente 1h30 depois da abordagem inicial, o motorista aproximou-se a pé do local da blitz e efetuou um disparo de arma de fogo contra um dos policiais, que fiscalizava uma motocicleta no momento.

O cabo Fábio Vieira do Nascimento, que estava dentro da viatura preenchendo um relatório no momento, disse não ter visto quando o homem aproximou-se do local, porém, ouviu o “estampido”.

Em seguida, o policial atingido disse algo para o cabo, que avistou o parceiro ferido por um tiro. O condutor do carro apreendido começou a disparar contra o cabo, que revidou os disparos.

Ainda conforme o boletim, em determinado momento, o homem parou de atirar. Ao se aproximar, o policial avistou que o motorista havia sido atingido e “neutralizado”.

Pouco tempo depois, a esposa do homem baleado chegou ao local e avistou a cena.

De acordo com o delegado responsável pelas investigações sobre o caso, Carlos Henrique Fernandes Gasques, a vítima chegou a ser socorrida e levada ao Hospital Municipal de Iepê, mas não resistiu aos ferimentos e morreu.

A arma utilizada pelo motorista, uma pistola de calibre 9mm, foi apreendida.

Assim como também foram apreendidas as duas pistolas de calibre .40 que eram utilizadas pelos policiais militares.

A Polícia Civil registrou o caso como homicídio decorrente de oposição à intervenção policial, em relação à morte de Fernando Paiano Gerônimo, e como dupla tentativa de homicídio qualificado, por motivo fútil e por ser contra os policiais militares, quanto aos disparos feitos contra o cabo e o soldado.

No tocante à conduta do cabo Fábio Vieira do Nascimento, o delegado Carlos Henrique Fernandes Gasques concluiu que "sua atitude está albergada por verossímil descriminante de legítima defesa à injusta agressão contra sua vida e do soldado Capuano, ao repelir a conduta delituosa". Com efeito, ele reconheceu provisoriamente a excludente de ilicitude, ressaltando também a sua apresentação espontânea.

O delegado ainda salientou que o cabo comunicou de pronto a polícia acerca dos fatos, viabilizando o socorro ao agressor lesionado, comparecendo e prestando as informações devidas à Polícia Civil, bem como exibindo sua arma de fogo, utilizada no revide contra Fernando Paiano Gerônimo.

Arma com registro

De acordo com o registro policial, o homem que atacou os policiais militares portava dentro da carteira um certificado de registro de arma de fogo expedido pelo Exército Brasileiro, que engloba atividade de caça, coleção e tiro desportivo, também conhecida pela sigla CAC.

Familiares do homem apresentaram documentos e uma nota fiscal da pistola, de calibre 9 milímetros, utilizada na troca de tiros com os policiais militares que trabalhavam na fiscalização de trânsito.

Na residência do mecânico, a corporação também teve acesso a declarações técnicas de aptidão do porte de arma de fogo, bem como nota fiscal da munição e autorização para tráfego de produtos controlados.

A perícia foi acionada até o local dos disparos e um inquérito policial foi instaurado para esclarecer o caso.

Licenciamento vencido

A câmera de segurança de um estabelecimento comercial flagrou o momento do crime. As imagens mostram o homem se aproximando a pé da viatura, às 23h01, e, em seguida, sacando uma arma de fogo e atirando contra um policial. Naquele momento, outro militar, que estava sentado no banco do passageiro, com a porta aberta, conseguiu escapar.

Segundo o delegado responsável pelo caso, Carlos Henrique Fernandes Gasques, a Polícia Militar fazia uma fiscalização de trânsito, por volta das 22h30, quando o homem foi abordado e os policiais constataram que o veículo dele estava com o licenciamento vencido desde o ano de 2019.

“Foi feita a apreensão administrativa e comunicado o condutor que este veículo seria recolhido. Ele questionou a decisão do policial militar, dizendo que 'deveria procurar outras atividades' e que o documento vencido não era uma 'causa suficiente', mas o policial explicou para ele que não tinha o que fazer, ele foi embora a pé e o policial acionou o guincho e ficou aguardando o retorno do guincho", explicou à TV Fronteira.

O delegado disse que, após cerca de uma hora e meia, quando a equipe da polícia ainda estava aguardando o guincho, o homem retornou até o local a pé.

“Segundo informações preliminares que a Polícia Civil coletou, familiares e amigos tentaram impedir que ele realizasse esta ação, mas não conseguiram, e ele veio por trás da equipe policial e deu um disparo, à queima-roupa, contra um dos policiais militares, atingindo a sua cabeça, 'de raspão', e um outro disparo que atingiu o seu braço e a sua mão. Este policial caiu ao solo”, detalhou o delegado.

Gasques ainda disse que, no momento dos disparos, outro policial “percebeu a ação e o barulho de estampido, se abrigou em um dos muros, ali próximo, e verbalizou para que este atirador entregasse a sua arma e colocasse as mãos no chão”.

“A verbalização não foi atendida e ele começou a efetuar disparos contra o outro PM. O outro policial revidou e um dos disparos atingiu a região da cabeça", pontuou à TV Fronteira.

O registro de CAC foi localizado na carteira do homem e, ainda conforme o delegado, a arma, que se tratava de uma pistola, estava “regularizada”.

“Fomos até a casa dele e encontramos a nota fiscal desta arma de fogo, então, assim, juridicamente, ele poderia ter esta arma em sua casa, mas não portar consigo, como ele fez no caso”, acrescentou.

Conforme Gasques, o homem não tinha “histórico de envolvimento em ocorrências policiais ou algo do tipo”.

"Nos depoimentos dos policiais militares, quando questionado se ele havia ingerido bebida alcoólica, o condutor do veículo falou que consumiu 'um pouco de bebida alcoólica no domingo [7], à tarde', mas, segundo o PM, ele não apresentava sinais característicos de embriaguez. Não era um condutor que dava sinais claros de que estaria embriagado. A conduta dele, retornando após uma hora e trinta minutos, denota que ele planejou este retorno e foi consciente", complementou à TV Fronteira.

Posicionamento oficial da Polícia Militar

Em nota oficial ao g1, a Polícia Militar do Estado de São Paulo esclareceu que, por volta de 0h10, na segunda-feira, policiais militares realizavam um bloqueio de trânsito, quando abordaram um veículo e, durante a fiscalização, "foi constatado que o licenciamento estava vencido, sendo informado ao condutor que o veículo seria removido ao pátio".

"Os policiais aguardavam a chegada do guincho, quando o indivíduo, após deixar o local a pé, retornou e efetuou disparos de arma de fogo contra os policiais, atingindo superficialmente um dos militares na cabeça. O outro policial efetuou disparos que atingiram o infrator, que cessou imediatamente a agressão", complementou a corporação.

A PM ainda relatou que o policial militar ferido foi socorrido e levado ao hospital, onde permanece em atendimento médico, com o quadro de saúde estável.

"O infrator foi socorrido ao Hospital Municipal de Iepê, onde entrou em óbito", pontuou a corporação. Com ele, que era CAC, foi apreendida uma pistola.

"Foi aberto um Inquérito Policial Militar para apurar as circunstâncias dos fatos", concluiu a PM ao g1.

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