Soltura do traficante André do Rap causa 'indignação e perplexidade', diz promotor de Justiça do Gaeco

14/10/2020 05h22 Lincoln Gakiya afirma temer mais concessões de liberdade para criminosos de alta periculosidade. André Oliveira Macedo deixou a Penitenciária 2 de Presidente Venceslau neste sábado (10).
Por G1, Presidente Venceslau - SP
Soltura do traficante André do Rap causa 'indignação e perplexidade', diz promotor de Justiça do Gaeco Promotor de Justiça Lincoln Gakiya, integrante do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco). (Foto: Reprodução)

“Indignação e perplexidade” foram as palavras usadas pelo promotor de Justiça Lincoln Gakiya, integrante do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), sobre a soltura do traficante André Oliveira Macedo, conhecido como André do Rap. Ele é um dos chefes do Primeiro Comando da Capital (PCC), facção criminosa que atua dentro e fora dos presídios de São Paulo. Ele foi libertado da Penitenciária Maurício Henrique Guimarães Pereira, a P2, de Presidente Venceslau (SP), na manhã deste sábado (10).

Em entrevista ao G1 e à TV Fronteira, o promotor de Justiça afirmou ver “com preocupação” a concessão do habeas corpus pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para um indivíduo de “alta periculosidade” e espera que a situação não se repita com outros criminosos.

O promotor de Justiça do Gaeco relatou que André do Rap “é um dos maiores traficantes de cocaína do Estado de São Paulo”, responsável pela remessa de cocaína do PCC para a Europa e envolvido com máfias italianas. Um criminoso “com alto poder aquisitivo”.

“Acho que a ordem pública e a sociedade como um todo ficam expostas com a liberdade de um indivíduo de tamanha periculosidade, condenado a mais de 25 anos de reclusão, duas sentenças, uma de primeiro grau e outra já confirmada pelo TRF-3”, disse.

Segundo Gakiya, a decisão surpreendeu os membros do Ministério Público Estadual (MPE). "Esperamos, inclusive, que ele se dirija para o endereço que declarou, no Guarujá, porque tememos que esse indivíduo, inclusive, fuja do país”, afirmou.

André do Rap foi solto por uma decisão do ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF). Por conta disso, o promotor afirma que não é possível acompanhar o criminoso até o local que ele falou que vive. Contudo, ele diz que é possível checar sua presença no endereço e, caso ele não seja encontrado, que as autoridades serão alertadas para que seja revogada essa medida e decretada novamente sua prisão.

O promotor explica que o ministro do STF usou como base da decisão a Lei Anticrime, aprovado pelo Congresso. “Na verdade, foi deturpado pelo Congresso, porque ele prevê que a cada 90 dias as decisões de preventiva sejam reavaliadas e, nesse caso específico, entre a condenação de primeira instância e a decisão do STF, passaram-se seis meses. Então, por um motivo meramente formal, o ministro, sem analisar a periculosidade do acusado, decidiu soltar o réu”.

Recurso

O traficante André do Rap tem duas condenações por tráfico internacional de drogas, que estão na Justiça Federal. O promotor de Justiça completou que a decisão do STF cabe recurso por parte da Procuradoria-geral da República, em Brasília (DF).

“O Ministério Público de São Paulo tentou ontem [9/10] à noite, inclusive, uma preventiva num processo que ele também responde na Justiça Estadual, aqui na Comarca de São Vicente, mas essa preventiva foi negada. Então, o Ministério Público Estadual também está estudando uma forma de recorrer dessa decisão que negou essa preventiva em São Vicente. Nós vamos tentar de todas as formas manter ou recapturar o André do Rap e fazer com que ele cumpra sua pena”, declarou.

Preocupações

Para Gakiya, a preocupação é que uma decisão como esta possa se estender a outros integrantes presos da facção criminosa.

“É um absurdo um indivíduo que já tem uma condenação em segunda instância, ou seja, já tem uma condenação de segundo grau de órgão colegiado, esteja posto em liberdade, porque a cada 90 dias não se apreciou se deve ou não ser mantida a preventiva. Então eu vejo com preocupação que essa mesma decisão possa ter reflexos pra outros criminosos igualmente perigosos, inclusive aqui da nossa região”, salientou o promotor.

Outra situação que preocupa o MPE é a possibilidade de que o traficante continue a aumentar os negócios e a lucratividade do PCC com o tráfico internacional de cocaína para a Europa. “Só no processo que ele foi condenado são quatro toneladas de cocaína, então são milhares de famílias, de vidas que são destruídas. Isso que realmente nos preocupa”, enfatizou Gakiya.

“O que eu queria manifestar ainda, por fim, é a minha indignação, não só minha, como também de todo o Ministério Público do Estado de São Paulo, não só do Ministério Público como das forças de segurança, as polícias Civil e Militar, o próprio sistema penitenciário, as circunstâncias em que esse indivíduo foi colocado em liberdade nos causou uma indignação e uma perplexidade muito grande. A gente espera que ações como essa não voltem a se repetir e que se restabeleça muito brevemente essa prisão, que é pra garantir a ordem pública”, finalizou.

Soltura

O traficante André Oliveira Macedo, conhecido como André do Rap, um dos chefes do Primeiro Comando da Capital (PCC), facção criminosa que atua dentro e fora dos presídios de São Paulo, foi libertado da Penitenciária de Presidente Venceslau, no interior paulista, na manhã deste sábado (10).

Ele teve um habeas corpus concedido pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello, divulgado no final da tarde de sexta-feira (9).

André do Rap foi preso em setembro de 2019, em uma operação feita pela Polícia Civil de São Paulo em um condomínio de luxo em Angra dos Reis, no litoral do Rio de Janeiro e é investigado por ter função de chefia dentro do PCC e gerenciar o envio de grandes remessas de cocaína à Europa.

Ao ser libertado neste sábado, André do Rap disse que mora no Guarujá, onde poderia ser encontrado.

Em nota, a Secretária da Administração Penitenciária (SAP) confirmou "que deu cumprimento hoje, 10, ao alvará de soltura em favor do preso André Oliveira Macedo, por decisão judicial do Supremo Tribunal Federal. Ele saiu da Penitenciária II de Presidente Venceslau às 11h50 da manhã."

Decisão de Marco Aurélio Mello

Na decisão que determinou a soltura, o ministro afirmou que o traficante estava preso há muito tempo provisoriamente. A legislação processual brasileira mudou em 2020, com o pacote anticrime, determinando que prisões provisórias sejam revistas a cada 90 dias para verificar se há necessidade de manutenção da prisão, o que, segundo Marco Aurélio, não ocorreu no caso de André do Rap.

De acordo com decisão do ministro, André do Rap deveria ser solto imediatamente porque já tinha um outro habeas corpus concedido a favor dele, expedido pelo próprio ministro, em um outro processo em que foi condenado a 15 anos, 6 meses e 20 dias de prisão, mas no qual ainda não há transitado em julgado da sentença.

O Ministério Público de São Paulo recorreu do habeas corpus concedido por Marco Aurélio sobre a condenação ainda sem trânsito em julgado. Sobre o segundo habeas corpus, concedido na sexta-feira (9) e que determinou a libertação do traficante, cabe à Procuradoria-Geral da República (PGR) recorrer.

O apontado como chefe do PCC só permaneceria preso se tivesse outras condenações com trânsito em julgado, o que não é o caso.

Decisão diferente no STF

A decisão do ministro Marco Aurélio se baseia em um trecho do pacote anticrime que não contava na versão original escrita pelo ex-ministro da Justiça Sergio Moro e por uma comissão de juristas comandada pelo ministro Alexandre de Moraes, também do STF, tendo sido adicionado ao pacote pelos parlamentares durante a tramitação do texto.

O dispositivo diz que um juiz que determina uma prisão preventiva deve "revisar a necessidade de sua manutenção a cada 90 dias, mediante decisão fundamentada, de ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal".

Em outro caso envolvendo um preso por tráfico no Ceará, o ministro Edson Fachin, do STF, negou revogar a preventiva por falta da revisão periódica do juiz sobre os fundamentos da prisão. A preventiva foi decretada em fevereiro do ano passado. Na decisão, Fachin afirmou que não houve excesso de prazo na prisão e que é preciso comprovar o prejuízo sofrido pela ausência da reavaliação no prazo.

"Ao tempo em que reconheço a existência de constrangimento ilegal pela ausência de ato judicial que deveria ser periodicamente realizado, nos termos do art. 316, parágrafo único do CPP, não visualizo, ao menos no momento, hipótese de nulidade a autorizar a imediata revogação da prisão preventiva", afirmou na decisão.

Prisão em condomínio de luxo

O traficante André de Oliveira Macedo foi preso em setembro de 2019, em Angra dos Reis, por uma equipe da Divisão Antissequestro do Departamento de Operações Policiais Estratégicas (Dope). Ele era procurado pela Interpol e a operação contou com uma equipe de 23 policiais do Garra, o Grupo Armado de Repressão a Roubos e Assaltos, do Gope, o Grupamento de Operações Penitenciárias Especiais e da Divisão Antissequestro.

André do Rap foi encontrado em um condomínio de luxo no bairro Itanema, que fica às margens da BR-101 (Rodovia Rio-Santos). Na residência, foram apreendidos dois helicópteros, um deles um B 4 avaliado em mais ou menos R$ 7 milhões e uma lancha de 60 pés, avaliada em R$ 6 milhões. A casa era alugada, mas ele tinha uma mansão na cidade, fora de um condomínio.

O preso era dono de um sítio investigado pelo Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) em Bertioga. Segundo o Deic, ele substituiu Wagner Ferreira, o “Cabelo Duro”, assassinado na porta de um hotel no bairro do Tatuapé, Zona Leste, logo depois das mortes de Gegê do Mangue e do Paca, no Ceará.

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