Venda de cotas de rádio para a irmã fez patrimônio de Aécio triplicar desde 2014

13/03/2018 07h49 Patrimônio de Aécio triplica depois da eleição de 2014. Salto é resultado de operação envolvendo cotas de emissora do tucano.
UOL, Brasília - DF
Venda de cotas de rádio para a irmã fez patrimônio de Aécio triplicar desde 2014 .

Documentos da Receita Federal revelam que o patrimônio declarado do senador Aécio Neves (PSDB-MG) triplicou após a eleição de 2014, quando foi derrotado por Dilma Rousseff (PT). O salto foi de R$ 2,5 milhões em 2015 para R$ 8 milhões em 2016.

O crescimento é resultado de uma operação financeira entre Aécio e sua irmã Andrea Neves envolvendo cotas que o senador detinha em uma rádio, a Arco Ãris, da qual foi sócio durante seis anos.

A quebra do sigilo fiscal do tucano foi ordenada pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em uma ação cautelar que corre paralelamente ao inquérito que investiga o parlamentar por ter pedido R$ 2 milhões ao dono da empresa de carnes JBS, Joesley Batista.

Metade dos recursos foi rastreada pela Operação Patmos, um desdobramento da Lava Jato no STF, que levou à prisão de Andrea, braço direito de Aécio quando ele governou Minas Gerais (2003-2010). Ela foi solta em junho.

Nas eleições de 2014, Aécio declarou ao TSE que suas cotas na Arco Ãris, afiliada da Jovem Pan, valiam R$ 700 mil, na forma de uma dívida que mantinha com a antiga dona, sua mãe.

Por dois anos, em 2014 e 2015, o tucano também declarou à Receita R$ 700 mil, conforme as cópias das declarações de Imposto de Renda agora em poder do STF.

Em setembro de 2016, Aécio decidiu vender suas cotas à outra sócia na rádio, Andrea. Ao realizar a operação, o senador declarou ao Fisco que elas valiam R$ 6,6 milhões, quase dez vezes mais do que um ano antes.

Ao mesmo tempo, a mãe de Aécio perdoou a dívida com o filho. Os mesmos R$ 6,6 milhões foram declarados por Andrea em seu Imposto de Renda -- cujo sigilo também foi quebrado pelo STF.

Aécio declarou que vendeu as cotas em 48 prestações, incluindo uma primeira parcela de R$ 380 mil.

Uma especialista em contabilidade ouvida pela Folha sob a condição de não ter o nome publicado disse que uma análise mais detalhada sobre o negócio na rádio impõe acesso aos balanços da emissora, para saber como se deu a grande valorização das cotas em tão pouco espaço de tempo. A PGR (Procuradoria-Geral da República) não pediu a quebra do sigilo fiscal da emissora.

QUESTIONAMENTO     

A saída do senador da empresa coincide com um crescente questionamento sobre a legalidade da propriedade de rádios e TVs por parlamentares federais. Para o Ministério Público Federal, a posse afronta a Constituição.

O patrimônio declarado de Aécio, 58, incluía em 2016 um apartamento em Belo Horizonte, com valor apontado pelo senador de R$ 222 mil, outro no Rio (R$ 109 mil), lotes em Nova Lima (MG) e metade de uma fazenda de 81 hectares em Cláudio (MG).

Andrea, 59, declarou em seu nome três apartamentos no Rio: um na avenida Vieira Souto, de R$ 1,7 milhão, um na avenida Atlântica (R$ 1,8 milhão) e outro na rua Prudente de Morais, em Ipanema (R$ 400 mil), além um apartamento e casas em Minas.

Os dados da Receita revelam que a rádio era a principal fonte de renda dos irmãos. Somente de 2014 a 2016 (período abrangido pela quebra de sigilo), Aécio recebeu R$ 3,1 milhões a título de lucros e dividendos não tributáveis, o triplo do que obteve do Senado como salário no mesmo período (R$ 1 milhão).

Os dados eram desconhecidos do eleitorado porque por lei os candidatos precisam declarar ao TSE, no ato de registro da candidatura, apenas bens, não rendimentos.

Aécio também declarou à Receita recebimentos da Empresa Folha da Manhã, que edita a Folha, à qual prestou serviço como colunista a partir de 2011.

A Folha remunera seus colaboradores, de diversos partidos e matizes ideológicos. Aécio deixou de ser colunista em maio de 2017, dias após a Operação Patmos. O senador declarou ter recebido R$ 13,2 mil (2014), R$ 21,4 mil (2015) e R$ 25,8 mil (2016).

OUTRO LADO

O advogado de Aécio Neves, Alberto Toron, disse que os R$ 6,6 milhões obtidos pelo parlamentar com a venda da rádio Arco Ãris foram calculados "com base no critério de valor de mercado".

Segundo ele, valor anterior, de R$ 700 mil, fora "fixado, à época, em oito vezes o valor patrimonial" das cotas.

De acordo com Toron, a entrada de Aécio na rádio em 2010, por meio das cotas obtidas de sua mãe, "tratou-se de uma negociação familiar, e cujos critérios foram absolutamente legais, uma vez que a lei permite negociações entre particulares".

Toron disse que o valor de R$ 700 mil é informado à Receita desde 2010 e a declaração do Imposto de Renda do senador "seguiu rigorosamente a legislação". "O exame minucioso do Imposto de Renda do senador Aécio não aponta qualquer irregularidade. Ao contrário, a análise dos dados demonstra a correção da sua conduta", diz o advogado.

Ele acrescentou que os dados fiscais "sempre estiveram disponíveis para as autoridades judiciais e, junto a elas serão sanados quaisquer questionamentos, caso venham a existir".

Para a defesa, a venda das cotas em 2016 "pelo valor do mercado demonstra o zelo do senador, uma vez que o levou ao pagamento de impostos muito mais altos".

Segundo a defesa, pesquisa Ibope indicou que a rádio foi a quinta mais ouvida na Grande BH de novembro de 2017 a janeiro de 2018.

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